Em Lisboa, temos Moedas, mas há quem receba milhões e outros tostões
O slogan de Carlos Moedas dizia que “Lisboa pode ser muito mais” e pode, se nela passarmos a investir ao invés de a deixarmos com tostões.
Esta semana, soubemos que o altar-palco do Papa nas Jornadas da Juventude terá um custo superior a 5M€, tendo a construção do mesmo sido atribuída por ajuste direto. Este custo será suportado pela Câmara Municipal de Lisboa.
Este valor e esta necessidade de ter o altar-palco mais espetacular de todos não é mais do que a nossa mania tipicamente portuguesa de querer ser o melhor aluno da escola, esquecendo os problemas que temos cá dentro.
Analisemos o caso de Lisboa.
Em outubro, já se falava que os pedidos de alimentação nas ruas de Lisboa tinham duplicado. Pedidos feitos por famílias, idosos e, ironicamente, também por estafetas que costumam entregar-nos as refeições que encomendamos. São pedidos que não são apenas de pessoas em situação de sem-abrigo, mas de quem cortou na alimentação para poder pagar o teto sob o qual vive ou que vive em quartos sem acesso a cozinhas.
Em Arroios, no Jardim António Feijó, há dezenas de pessoas a dormir em tendas, colocando-se até questões de salubridade. Há quem esteja nesta situação e até tenha um emprego, mas que não lhe permite suportar os elevados custos de habitação que já não são exclusivos da capital.
Ainda em relação às Jornadas, sabe-se que o custo para a Câmara Municipal de Lisboa deverá ser superior a 35 milhões de euros. A título de comparação, a medida de transportes públicos grátis para idosos e estudantes custará à Câmara de Lisboa menos de 15 milhões de euros ao ano.
Em causa, não está a natureza religiosa do evento, mas os valores envolvidos a que se juntam, por exemplo, os 6 milhões de euros (valor de 2022) de contribuição da Câmara Municipal de Lisboa para o Web Summit.
Visto assim, nem parece que ainda existem bairros, como é o caso da Quinta do Ferro, na Freguesia de São Vicente, sem saneamento básico, algo que foi reivindicado ao longo dos anos pelos moradores e parece agora ter um interesse real da autarquia, cuja reabilitação está estimada em 5 milhões de euros.
Estima-se que o retorno financeiro para a cidade destes e outros eventos é superior ao que a Câmara investe neles, mas isso justifica que não se invista nas pessoas que habitam na capital? Isso justifica que mês após mês, as queixas dos moradores da Capital sobre o lixo e a sujidade das ruas permaneçam sem resposta? Justificará que não haja uma comparticipação da Câmara para que sejam disponibilizados mais e melhores transportes públicos? Ou que não seja feito um investimento para reabilitar imóveis que pertencem à Câmara, disponibilizando-os para habitação pública prioritária a setores-chave da economia (como educação, saúde ou segurança), aumentar a oferta de rendas acessíveis e de alojamentos para estudantes deslocados?
O slogan de Carlos Moedas dizia que “Lisboa pode ser muito mais” e pode, se nela passarmos a investir ao invés de a deixarmos com tostões.