202 kms de distância, dois mundos diferentes
Enquanto em Lisboa há quem celebre a melhoria do SNS, em Serpa, no Alentejo, morrem pessoas às portas de umas Urgências fechadas.
Na mesma semana em que o Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, respondeu a críticas da oposição acerca da falta de capacidade de resposta do SNS às necessidades dos utentes, afirmando que o SNS “está melhor, está a produzir mais” e a prestar mais cuidados aos utentes, hoje, dia de 30 Junho de 2023, no Baixo Alentejo, na cidade de Serpa, distrito de Beja, morre um homem com cerca de 60 anos, de paragem cardiorrespiratória, porque quando se dirigiu ao serviço de urgência do Hospital de São Paulo, em Serpa, este se encontrava encerrado – os Bombeiros de Serpa ainda tentaram reanimá-lo, mas sem sucesso.
Há quase um ano estive presente numa manifestação em Serpa, na minha cidade, com outros membros do Volt Portugal, uma manifestação organizada pelo Movimento de Defesa do Hospital de São Paulo, a exigir um serviço de urgências aberto 24h por dia, como foi acordado entre o Ministério da Saúde e a Santa Casa da Misericórdia no Acordo de Cooperação assinado entre ambas as entidades a 14 de Novembro de 2014, que transferiu a gestão do hospital para a Santa Casa da Misericórdia até 2025, passando o hospital a integrar o SNS, com o objetivo de “contribuir para mais e/ou melhor acessibilidade e mais oferta de cuidados de saúde à população”* através de, entre outros serviços prestados, um Serviço de Urgência Avançado 24 horas por dia.
De há alguns anos para cá, no entanto, o “Serviço de Urgência Avançado” do Hospital de São Paulo, em Serpa, tem estado encerrado durante a noite, entre as 00h e as 8h, uma vez que, segundo a provedora da Misericórdia de Serpa, a mesma “não tem conseguido manter as urgências abertas 24 sobre 24 horas”**, ou seja, durante 8 horas, o concelho de Serpa não tem urgências para onde os seus habitantes que se encontrem em estado grave se possam dirigir, como foi o caso do homem de 60 anos a quem esta negligência custou a vida.
Há anos que a população da cidade e do concelho de Serpa se manifesta e exige um serviço de urgências em condições, disponível 24 sobre 24 horas, que dê uma resposta adequada às necessidades dos habitantes, neste concelho com uma população bastante envelhecida, e cujo único outro hospital para onde se podem dirigir, é o Hospital de Beja que, como também já foi denunciado várias vezes, também não tem capacidade de resposta.
Esta exigência tem sido categoricamente ignorada, e hoje um habitante da minha cidade e a sua família pagou o preço.
É inadmissível que num concelho tão extenso como o de Serpa, com uma população envelhecida, que precisa destes serviços, o único hospital existente não ter um serviço de urgências aberto 24 sobre 24 horas como é suposto ter.
Em simultâneo, ouvir o nosso Ministro da Saúde congratular-se pelo quão melhor o SNS está a funcionar, a dizer que está a prestar mais cuidados aos utentes, não só é revoltante como, demonstra uma vez mais, a completa desconexão que existe entre o Governo e a realidade do país que governa, particularmente no que diz respeito à realidade do interior do nosso país, onde pessoas morrem à porta de um hospital porque o mesmo não tem condições para assegurar um serviço de urgências aberto 24 horas por dia.
Urge combater esta mentalidade centralista que deixa o interior do nosso país ao abandono, sem condições de vida e completamente esquecido e que, no final de contas, custa a vida aos nossos cidadãos.
FONTES:
* http://www.arsalentejo.min-saude.pt/utentes/cuidadossaude/AcordosConvencoes/Paginas/Acordo-de-Coopera%C3%A7%C3%A3o-para-Presta%C3%A7%C3%A3o-de-Cuidados-no-Hospital-
S%C3%A3o-Paulo---Serpa.aspx
** https://www.vozdaplanicie.pt/index.php/noticias/serpa-homem-morreu-nesta-sexta-feira-30-a-porta-das-urgencias-do-hospital