Ameaças e Bluffs: Europa e a necessidade de uma Defesa comum
Dimitri Medvedev, ex-presidente russo e atual vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, afirmou na última semana que "não se pode descartar nada" na defesa do território russo.
Afirmou, também, a possibilidade de vários rumos que a Rússia poderia escolher tomar na guerra da Ucrânia. Rumos que parecem ser cada vez mais improváveis, tendo em conta que as forças armadas russas estão a usar relíquias de museu na sua "intervenção especial".
No entanto, a ameaça nuclear continua a pairar no ar, tendo já sido várias vezes usada como "bluff" por Putin ou pelo seu governo.
Estas e outras tácticas continuam a ser usadas para dissuadir o Ocidente de apoiar a Ucrânia, tendo, por várias vezes, sido feita a pergunta se devemos de facto continuar a alimentar a máquina de defesa Ucraniana já que estamos a correr o risco de uma guerra nuclear.
Risco este que parece tornar-se maior de cada vez que Putin se sente encurralado, já que quanto mais desesperado se sente, mais irracionalmente age.
Tal como num jogo de poker, é necessário que o Ocidente perceba quando está perante bluff ou uma "jogada" real, e, neste momento, a narrativa russa demonstra um bluff demasiado óbvio, tendo já por várias vezes ameaçado usar armas nucleares e afirmado que iria invadir outros países europeus, quando na realidade eles não estão na posição de implementar qualquer uma das ameaças, já que isso significa a destruição certa da Rússia.
Desta forma, é essencial que medidas como a da União Europeia, que irá encomendar em conjunto, armas e munições para continuar a fazer doações aos defensores da democracia liberal, continuem nas agendas políticas dos países europeus e não só.
Por outro lado, é crucial que os próprios doadores se armem e preparem caso seja necessário intervir directamente no conflito, como seria o caso de uma eventual ativação do artigo 5.º da NATO, como por pouco foi o caso de Novembro do ano passado, onde um míssil atingiu território polaco e por extensão, território da NATO.
Existe ainda a questão de Taiwan, cujo conflito diplomático poderá evoluir para um conflito armado nos próximos anos. A União Europeia e os seus aliados necessitam de estar preparados para tal eventualidade, o que infelizmente não é ainda o caso para todos os países membros da União, tal como a Alemanha, cuja política de desarmamento tornou ineficiente as suas forças armadas.
Apesar de entender as circunstâncias em que foram tomadas estas decisões, não posso deixar de ficar frustrado para com o país natal do meu pai, que repetidamente demonstra ter uma mentalidade de maior preocupação para com a burocracia interna excessiva que para com os problemas que o rodeiam.
No entanto, compreendo que é essencial colaborarmos de forma cada vez mais aprofundada com os nossos parceiros, para assegurar que o nosso projecto comum da União Europeia não seja tomado, interna ou externamente, por regimes autoritários que não partilham dos nossos valores.
Portugal, por sua vez, é um caso não tão agudo, mas representativo de que a Europa, como um todo, se sentiu muito à vontade com a paz no nosso continente e ignorou repetidamente os vários avisos de que não era seguro baixar a guarda.
Por muito que seja ideal e tentadora, a realidade atual não é a de paz, e mesmo existindo, está sempre a pouca distância de ser quebrada, devido aos regimes totalitários.
Não podemos cair na ingenuidade de que ditadores querem chegar a um acordo ou que dê sequer para negociar com eles. Política de apaziguamento é uma abordagem falhada, é necessário que se leve a sério ameaças, bluffs ou ataques e que se aja em concordância.
Desta forma, é essencial que projectos, como um exército europeu comum, tenham a máxima prioridade e que sejam eficazes, transmitindo uma mensagem clara que vá dissuadir qualquer tentativa de intimidação.
Os valores europeus de democracia, responsabilidade social e climática e de um mercado livre único são fantásticos, mas sem uma forma real de os defender, rapidamente se tornam uma distante memória de tempos melhores.
Evidentemente, não devemos abusar do nosso poder e atuar como a polícia mundial, como é o caso dos USA. Devemos, sim, oferecer a nossa ajuda a qualquer país que a necessite e só agiremos se for de acordo com os nossos valores e se expressamente requisitado.
Mas até lá, a nossa preocupação tem necessariamente de ser para com a segurança do nosso continente, dos cidadãos que nele vivem e das ideias que cá são defendidas.
Projetos como a "Visão Comum do Exército" entre os Países Baixos e Alemanha são de louvar e incentivar, por serem um importante primeiro passo para a criação das forças armadas europeias. A sua implementação poderá ser faseada, com a participação inicial de apenas alguns estados-membros e com a expansão futura do projeto a outros membros da União.
A criação das forças armadas europeias é de extrema importância, de forma a acrescentar uma componente militar credível à abordagem global de segurança da UE para com entidades terceiras, e tornar menos dispendiosa a sua manutenção, já que uma organização de defesa europeia iria beneficiar de economias de escala nos contratos militares e na logística, processo que se mostrou eficaz aquando da aquisição de vacinas Covid-19.