Ameaças e Bluffs: Europa e a necessidade de uma Defesa comum

Dimitri Medvedev, ex-presidente russo e atual vice-presidente do Conselho de Segurança da Rússia, afirmou na última semana que "não se pode descartar nada" na defesa do território russo.

29 de mar de 2023
Yannick Schade

Afirmou, também, a possibilidade de vários rumos que a Rússia poderia escolher tomar na guerra da Ucrânia. Rumos que parecem ser cada vez mais improváveis, tendo em conta que as forças armadas russas estão a usar relíquias de museu na sua "intervenção especial".

No entanto, a ameaça nuclear continua a pairar no ar, tendo já sido várias vezes usada como "bluff" por Putin ou pelo seu governo.

Estas e outras tácticas continuam a ser usadas para dissuadir o Ocidente de apoiar a Ucrânia, tendo, por várias vezes, sido feita a pergunta se devemos de facto continuar a alimentar a máquina de defesa Ucraniana já que estamos a correr o risco de uma guerra nuclear.

Risco este que parece tornar-se maior de cada vez que Putin se sente encurralado, já que quanto mais desesperado se sente, mais irracionalmente age.

Tal como num jogo de poker, é necessário que o Ocidente perceba quando está perante bluff ou uma "jogada" real, e, neste momento, a narrativa russa demonstra um bluff demasiado óbvio, tendo já por várias vezes ameaçado usar armas nucleares e afirmado que iria invadir outros países europeus, quando na realidade eles não estão na posição de implementar qualquer uma das ameaças, já que isso significa a destruição certa da Rússia.

Desta forma, é essencial que medidas como a da União Europeia, que irá encomendar em conjunto, armas e munições para continuar a fazer doações aos defensores da democracia liberal, continuem nas agendas políticas dos países europeus e não só.

Por outro lado, é crucial que os próprios doadores se armem e preparem caso seja necessário intervir directamente no conflito, como seria o caso de uma eventual ativação do artigo 5.º da NATO, como por pouco foi o caso de Novembro do ano passado, onde um míssil atingiu território polaco e por extensão, território da NATO.

Existe ainda a questão de Taiwan, cujo conflito diplomático poderá evoluir para um conflito armado nos próximos anos. A União Europeia e os seus aliados necessitam de estar preparados para tal eventualidade, o que infelizmente não é ainda o caso para todos os países membros da União, tal como a Alemanha, cuja política de desarmamento tornou ineficiente as suas forças armadas.

Apesar de entender as circunstâncias em que foram tomadas estas decisões, não posso deixar de ficar frustrado para com o país natal do meu pai, que repetidamente demonstra ter uma mentalidade de maior preocupação para com a burocracia interna excessiva que para com os problemas que o rodeiam.

No entanto, compreendo que é essencial colaborarmos de forma cada vez mais aprofundada com os nossos parceiros, para assegurar que o nosso projecto comum da União Europeia não seja tomado, interna ou externamente, por regimes autoritários que não partilham dos nossos valores.

Portugal, por sua vez, é um caso não tão agudo, mas representativo de que a Europa, como um todo, se sentiu muito à vontade com a paz no nosso continente e ignorou repetidamente os vários avisos de que não era seguro baixar a guarda.

Por muito que seja ideal e tentadora, a realidade atual não é a de paz, e mesmo existindo, está sempre a pouca distância de ser quebrada, devido aos regimes totalitários.

Não podemos cair na ingenuidade de que ditadores querem chegar a um acordo ou que dê sequer para negociar com eles. Política de apaziguamento é uma abordagem falhada, é necessário que se leve a sério ameaças, bluffs ou ataques e que se aja em concordância.

Desta forma, é essencial que projectos, como um exército europeu comum, tenham a máxima prioridade e que sejam eficazes, transmitindo uma mensagem clara que vá dissuadir qualquer tentativa de intimidação.

Os valores europeus de democracia, responsabilidade social e climática e de um mercado livre único são fantásticos, mas sem uma forma real de os defender, rapidamente se tornam uma distante memória de tempos melhores.

Evidentemente, não devemos abusar do nosso poder e atuar como a polícia mundial, como é o caso dos USA. Devemos, sim, oferecer a nossa ajuda a qualquer país que a necessite e só agiremos se for de acordo com os nossos valores e se expressamente requisitado.

Mas até lá, a nossa preocupação tem necessariamente de ser para com a segurança do nosso continente, dos cidadãos que nele vivem e das ideias que cá são defendidas.

Projetos como a "Visão Comum do Exército" entre os Países Baixos e Alemanha são de louvar e incentivar, por serem um importante primeiro passo para a criação das forças armadas europeias. A sua implementação poderá ser faseada, com a participação inicial de apenas alguns estados-membros e com a expansão futura do projeto a outros membros da União.

A criação das forças armadas europeias é de extrema importância, de forma a acrescentar uma componente militar credível à abordagem global de segurança da UE para com entidades terceiras, e tornar menos dispendiosa a sua manutenção, já que uma organização de defesa europeia iria beneficiar de economias de escala nos contratos militares e na logística, processo que se mostrou eficaz aquando da aquisição de vacinas Covid-19.

Artigo de Opinião

Escrito por Yannick Schade, Secretário Geral do Volt Portugal e publicado no DN em 28 de março de 2023